quinta-feira, 7 de agosto de 2014

SANÇÕES

Por José Goulão, em Jornalistas Sem Fronteiras
O manuseamento de sanções económicas, políticas e militares no âmbito da chamada comunidade internacional é uma das práticas que mais traduz a arbitrariedade e a mentalidade ditatorial que reinam na ordem mundial.
O acto de sancionar um país, instituições ou dirigentes não é geral e universal, não obedece a regras objectivas, a leis incluídas em qualquer código de Direito credível. É discricionário, interesseiro, conjuntural e está nas mãos de decisores que, além de mentir, assumem eles mesmos os comportamentos pelos quais sancionam os outros. A sanção é um instrumento de poder que está verdadeiramente na mão de governos ou alianças de governos autistas e autoritários e não de instâncias internacionais como a ONU, por exemplo.
Durante muito tempo o exemplo mais flagrante da arbitrariedade de quem sanciona foi a perseguição ao Irão, que se mantém – mesmo admitindo-se que venha a ser atenuada – num quadro de punição aos países que os Estados Unidos da América, e os outros que lhes obedecem, definiram como “párias”.
Porém, como consequência natural da impunidade com que actuam os poderes dominantes mundiais, os exemplos ampliaram-se e tornaram-se até grosseiros, não hesitando os decisores em servir-se da mentira se isso for necessário às suas conveniências.
A chacina que Israel pratica entre a população praticamente indefesa da Faixa de Gaza tem sido condenada a vários níveis, mesmo de onde é difícil que saiam palavras dissonantes da ordem norte-americana, como é o caso do secretário geral da ONU em serviço.

Não há, ao nível de quem manda no mundo, quem ouse falar em sanções contra os crimes israelitas. Talvez porque o siofascismo reinante em Israel seja uma manifestação de “civilização” nos tempos que correm; e, por certo, devido à “indestrutível” aliança entre Israel e os Estados Unidos da América, senhores das sanções, uma vez que a carnificina está, no fundo, em sintonia com a ordem mundial – onde a “guerra contra o terrorismo” é conduzida também por terroristas.
Outro exemplo relacionado, não com a omissão mas com a aplicação de sanções, é o das punições adoptadas pelos Estados Unidos contra a Rússia e que Washington mandou a União Europeia igualmente aplicar, ainda que isso possa ter custos elevados para os europeus.
As sanções a Moscovo começaram por ser estabelecidas devido ao suposto apoio às milícias antifascistas que se opõem à junta de Kiev no Leste e Sudeste do país – apoio de que não existem provas factuais – e agravaram-se com base na abusiva responsabilização da Rússia pela tragédia do voo MH 17 da Malaysian Airlines registada na Ucrânia.
Os Estados Unidos e a União Europeia, tal como a Rússia, o governo da Malásia, Kiev e os “separatistas”, defendem em uníssono a criação de uma comissão internacional para apurar as verdadeiras causas da queda do avião. Supõe-se, pois, que Washington e Bruxelas querem conhecer o que se passou – deduzindo-se, legitimamente, que não sabem – pelo que decidir sanções numa situação que admitem ser de dúvida é, no mínimo, precipitado.
Acresce, como lembraram antigos altos quadros da CIA numa carta enviada ao presidente Obama, que o governo dos Estados Unidos não apresentou “uma única prova” de que a Rússia tenha derrubado o avião malaio o que, como assinalam, “não é bom para a credibilidade” da Administração.

As sanções impostas pelos Estados Unidos e a União Europeia à Rússia são, portanto, um acto premeditado e sem fundamento de violência e de desestabilização das relações internacionais. A outra face da moeda é que, desta feita, o passo pode ser maior do que as pernas e as sanções vão ter troco, atingindo sobretudo os cidadãos e as economias dos países europeus – que Bruxelas tornou assim reféns de medidas que nem os mais ferozes adeptos da guerra fria se atreviam a aplicar.

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