Por Carvalho da Silva, no Jornal «JN»
Ademissão do secretário de Estado da Energia, Henrique Gomes,
substituído por Artur Trindade, até agora diretor de Custos e Proveitos da
Entidade Reguladora do Setor Energético, foi um processo simples, mas dele
exalam cheiros complicados.
Para além de se registar que o novo secretário de Estado roda entre a função
fiscalizadora e a função executiva, devemos observar com atenção: as notícias
vindas a público sobre o discurso que o ex-secretário de Estado estaria para
fazer no ISEG, onde mencionaria que o "lucro excessivo na energia tira 3500
milhões de euros à economia e às famílias até 2020"; o aumento de 10% na fatura
da luz em 2013 que está a ser preparado; as provas de que o senhor Mexia se
encheu de mexer no processo que levou à demissão do anterior secretário de
Estado (leiam-se as suas intervenções públicas); a confirmação da intervenção
protecionista do poder político (Governo) na defesa dos interesses dos
acionistas privados da EDP, confirmando-se claramente por que razão os figurões
da área do Governo - Eduardo Catroga e C.ª - foram "colocados pelos acionistas"
em órgãos da EDP.
Mas, nesta semana tivemos outras notícias de interesse e, acima de tudo, que
colocam aos trabalhadores e ao povo uma forte exigência de protesto, de
denúncia, de luta pela mudança de rumo que o país segue.
Olli Rehn, comissário europeu, veio a Portugal dizer-nos, depois de múltiplas
reuniões e auscultação do Governo, que "as reformas estão a correr bem",
exatamente no dia em que Portugal foi referenciado como o país onde se está a
destruir mais emprego, logo a seguir à Grécia, e onde a queda dos salários nos
últimos meses é mais acentuada.
Foi notícia a burla tributária de 1,4 milhões de euros que terá sido
praticada na compra da Compal pela Inbepor. Segundo o JN de 14.03 "os arguidos
deverão alegar que o Fisco não pode considerar-se enganado, pois dispunha de
meios para saber que a Inbepor não teria atividade no ramo das bebidas". É
preciso ter lata! Parecem anjinhos que agiram sem consciência do que estavam a
fazer.
Torne-se conhecido quem são as "personalidades" com responsabilidades nas
empresas envolvidas, quem são os advogados ou as entidades de auditoria a fazer
negócio no processo. Isso ajudará a clarificar águas e mostrará verdades
necessárias aos portugueses.
Com a portaria n.º 320/2011 de 30 de dezembro está assegurado às grandes
empresas um "gestor de contribuinte" personalizado, que lhes tem de "prestar
assistência pré-declarativa", esclarecer dúvidas, dar "informação constante de
bases de dados" e outra disponível e "acompanhar os processos de benefícios
fiscais". Será que essa determinação é para evitar as fraudes e fuga ao Fisco
que proliferam, ou para colocar os melhores quadros da Administração Fiscal como
consultores gratuitos e depois serem responsabilizados pelos possíveis erros (ou
burlas) que venham a ser cometidos?
No contexto da visita de Olli Rehn, o ministro Vítor Gaspar, reconhecendo
implicitamente que a carga fiscal sobre os portugueses e sobre a generalidade
das empresas é grande, promete para o futuro um sistema fiscal "capaz de ser
amigo da competitividade e do emprego". Tal afirmação, vinda de um ministro para
quem os problemas concretos das pessoas, da sociedade, das funções sociais do
Estado não contam, o que significa?
Significa que: os interesses dos ricos e poderosos são salvaguardados e
reforçados; os rendimentos do trabalho baixam; o desemprego alastra
violentamente; a pobreza acentua-se; as classes médias são destruídas fruto de
uma política económica e social desastrosa; significa uma política fiscal cada
vez mais ardilosa, opaca e injusta, infestada de promiscuidades entre poder
político e grandes interesses financeiros e económicos.
A austeridade do "custe o que custar" destrói a economia, reduz as receitas
do Estado e empobrece os portugueses. E estamos perante uma política carregada
de maldades múltiplas, em nome de falsas promessas de futuro.
Para travar este estado de coisas é preciso, e já, forte ação social e
política e mobilização dos portugueses e portuguesas.
Parece que as pessoas se fecham à realidade que não querem ver o óbvio.
ResponderEliminarNão consigo entender esta anestesia colectiva.