Os BRICS – Brasil, Rússia, Índia, China e África – criaram em Fortaleza o seu banco internacional, o Novo Banco para o Desenvolvimento (NBD), e um Fundo de Reserva para fazer frente aos efeitos das tempestades financeiras. O FMI e o Banco Mundial deixaram de estar sós no mundo, de funcionar como um monopólio para impor práticas políticas e económicas em todo o planeta a pretexto da concessão de empréstimos e “ajudas”.
“As instituições de Brentton
Woods levaram o maior abanão da sua história com a decisão dos BRICS na sua
cimeira de Fortaleza”, nota Francisco de Oliveira Filho, economista
especializado na área de Economia Social. “O Banco Mundial e o FMI têm agora
verdadeiros rivais, sobretudo se as novas instituições conseguirem ser aquilo
que se propõem ser: alternativas para o desenvolvimento, a criação de
infraestruturas, o combate à pobreza e às desigualdades e a protecção
ambiental”, acrescentou.
A imprensa oficial neoliberal
europeia e norte-americana reagiu às notícias de Fortaleza com uma postura caracterizada
pelo cepticismo, invocando como problemas inerentes às novas instituições a
diminuição da velocidade de crescimento económico dos cinco países, as suas
diferenças políticas e económicas e a distância geográfica entre eles.
“Esse tom é confissão das
inquietações que atravessam agora os templos neoliberais, o FMI e o Banco
Mundial e revela o reconhecimento, à partida, de que novas instituições podem
retirar-lhes capacidade para impor o que lhes convém e vai obrigá-los a rever
metodologias e a confrontar-se com as suas próprias burocracia e ineficácia”,
afirma Telma Fagundes, analista económica de São Paulo. “Afinal os arautos da
livre concorrência não deviam estar assim tão incomodados com o aparecimento de
instituições no mesmo terreno, mas realmente costuma ser muito mais fácil
apregoar a concorrência quando se está em situação de monopólio”, acrescenta a
economista.
Os BRICS representam quase três
mil milhões de seres humanos, cerca de 40 por cento da população mundial, um
quinto do PIB mundial e albergam metade dos pobres do planeta. O Novo Banco
para o Desenvolvimento vai ser dotado com 100 mil milhões de dólares, a mesma
quantia de que disporá o Fundo de Reserva. A China terá ultrapassado
recentemente os Estados Unidos da América como maior economia mundial, segundo
estatísticas do próprio FMI.
“Ao contrário do que dizem muitas
vozes neoliberais, as diferenças políticas e de estádios económicos dos cinco
países são vantagens e não problemas para as novas instituições”, diz Oliveira
Filho. “Afirma-se também que o prolongamento do processo de constituição
através de dois anos traduz profundas divergências, o que sendo verdade pode
representar uma maior consistência no arranque, devido à densidade do debate
realizado. Antes divergências criativas e socialmente orientadas do que
convergências burocráticas vocacionadas para a escravização social”,
acrescentou o economista.
As novas instituições terão sede
em Xangai. O primeiro presidente do NBD será indiano, o director geral será
brasileiro e a Rússia designará o governador central. “A ideia de criar o Novo
Banco de Desenvolvimento partiu da Índia e, por isso, nada mais justo de que o
seu primeiro presidente ser um indiano”, defendeu Dilma Rousseff em declarações
proferidas em Fortaleza.
A presidenta brasileira sublinhou
que as novas instituições não nascem contra outras, “mas sim em defesa dos
nossos próprios interesses. O mundo converteu-se em qualquer coisa de bilateral
e as instituições que o representam devem ser assim”, acrescentou.
O presidente chinês, Xi Jinping,
declarou que o novo banco e o fundo de reserva deverão contribuir para
“aperfeiçoar o sistema mundial de governo e aumentar a representação dos países
emergentes e a sua capacidade para se fazerem ouvir sobre os assuntos
internacionais”.
Telma Fagundes sublinhou que
“mais importante do que o FMI e o Banco Mundial terem agora alternativas é o
facto de as novas instituições estarem a nascer com objectivos diferenciados e
orientações económicas à partida mais vocacionadas para o combate às desigualdades,
a construção de infraestruturas e o desenvolvimento em sectores humanitários
básicos como a educação e a saúde, que as instituições de Brenton Woods encaram
como fontes de despesas a reduzir ou eliminar”.
Precisamente setenta anos depois
de, sob a tutela norte-americana, os quase 50 países participantes na reunião
de Brentton Woods, em solo britânico, terem criado o FMI e o Banco Mundial,
cinco grandes nações em desenvolvimento “podem contribuir para criar uma nova
ordem económica mundial”, considera Francisco de Oliveira Filho.
“É importante ter em conta que, a
par destas instituições, os BRICS também debatem questões relacionadas com as
políticas monetárias mundiais; por estes caminhos, o reino absoluto do dólar
pode estar a chegar ao fim”, admite Telma Fagundes.
Luís O. Nunes, Fortaleza
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