A União Europeia não resistiu às
suas próprias eleições, através das quais procuraria chancelar um conteúdo democrático que não tem. Desta
conclusão global decorrem todas as análises parcelares, sejam sobre a abstenção,
sobre a subida da extrema direita, sobre as falências ideológicas, sobre o
primado dos mercados, sobre a falsa história oficial do nascimento e
desenvolvimento da integração europeia.
Ironia das ironias, as eleições europeias não
tiveram mais valor democrático do que as que a União Europeia apadrinhou na
Ucrânia, legitima no Egipto ou excomunga na Síria. Se na União votaram muito
menos de metade das pessoas recenseadas, na Ucrânia não votou meio país, no
Egipto o partido mais votado foi proibido de concorrer, na Síria vota-se em
plena guerra civil a cujas origens a União Europeia não é alheia.
Sendo a União Europeia uma
entidade que, de braço dado com os Estados Unidos da América, define e propaga
a democracia, mesmo que para tal seja preciso criar guerras, o cenário descrito
nada tem de contraditório. É apenas trágico.
Nas eleições europeias venceu a
austeridade, triunfaram os mercados. Tudo se passou como naqueles jogos de
futebol em que já se sabem os resultados de antemão porque o árbitro está
comprado.
Sabia-se à partida que o vencedor
seria a coligação não assumida entre as correntes que teimam em chamar-se
sociais democratas e democratas cristãs quando não passam da cara e coroa da
moeda neoliberal. A social democracia morreu há muito, nos tempos em que o redentor
“socialismo democrático” foi sepultado em múltiplas gavetas, seja por ordens do
FMI, seja porque o capitalismo ganhou forças para soltar os mercados ao vento.
A democracia cristã perdeu pelo caminho a doutrina social da igreja e uma ética
que se extinguiu simbolicamente no dia em que a coligação criminosa de
mercados, políticos e mafia assassinou Aldo Moro.
Ganharam pois os que governam e
já tinham ganho antes, e antes, e antes porque social democracia e a democracia
cristã, hoje irmãs do mesmo sangue, formam o “arco da governação” onde não cabe
ou caberá mais ninguém enquanto as coisas estiverem como estão. E estão nas
mãos da austeridade, do autoritarismo e dos mercados, contra as pessoas.
Por isso muito mais de metade das
pessoas não votaram – em países como a Eslováquia votaram 12 em cada 100 – e
muitas fizeram-no seguindo führers, gaulaiters, cappos fazendo-as crer que a
História se enganou em 1945 e todos os males vêm daí, a começar por aquilo que
é a União Europeia. Males que a União Europeia confirma e assume praticando
como democracia aquilo que nada tem a ver com democracia. Por isso o fascismo
já não se limita a espreitar, age, manipula e actualizou-se economicamente, não
tem qualquer repugnância pelo neoliberalismo, vê nele um sistema de poder
autoritário e ditatorial tão bom como os melhores. O teste da Ucrânia é
conclusivo – observe-se como o fascismo “pró-europeu” e esta democracia
vigorando na União Europeia se entendem tão bem.
Como pessoas e cidadãos somos
todos vítima desta armadilha. A única maneira de nos libertarmos dela é
destruindo-a.
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