O presidente da Alemanha Joachim Gauck, que esta semana esteve em Portugal em visita oficial, aproveitou a conferência de imprensa conjunta com o seu homólogo Cavaco Silva para classificar o nosso País como «um bom exemplo de reformas bem-sucedidas» num quadro de «solidariedade europeia». Gauck também disse, entre outras coisas, que a «relação entre a Alemanha e os países mais pequenos da Europa é marcada pela solidariedade», o que segundo ele está patente «nos grandes meios financeiros que são disponibilizados» a esses países.
Como ninguém se lembrou de perguntar a que «reformas bem sucedidas» se referia o distinto visitante, fica-nos a dúvida se as suas palavras se reportavam ao corte do abono de família às crianças de agregados com um rendimento mensal acima de 628 euros; aos despedimentos em massa na administração pública; à queda, em termos reais, das remunerações do trabalho em cerca de 10 por cento entre 2010 e 2013; à destruição de direitos sociais e laborais; ao enorme aumento de impostos; ao empobrecimento generalizado da população; à maior recessão acumulada desde a 2.ª guerra mundial; ao desemprego massivo; à emigração forçada de centenas de milhares de portugueses; à liquidação progressiva da escola pública, da Segurança Social, do Serviço Nacional de Saúde; à dívida pública, que em percentagem do PIB passou de 94 por cento para 132,4 por cento...
Ou será que Gauck, nada sabendo destas particularidades nacionais, se referia à privatização de lucrativas empresas e sectores fundamentais para a economia do País, tão apetitosas para o capital alemão (e não só), vendo na compra a pataco a expressão da tal solidariedade europeia? Ou que se estivesse a lembrar – o que é muito plausível – das palavras de Paulo Portas aos investidores alemães, gabando a redução do IRC, os benefícios fiscais e a reforma laboral «mais atractiva para o investimento»?
Quanto a Cavaco Silva, fez o que seria de esperar de quem há muito perdeu de vista os interesses nacionais: garantiu que o «bom aluno» aprendeu «a lição». É o que acontece quando se confunde a governação com o País.
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