segunda-feira, 11 de março de 2013

Cegueira e insensatez

Por Carvalho da Silva, no Jornal «JN»

Passos Coelho ao afirmar, em plena Assembleia da República, que "aumentar o salário mínimo geraria mais desemprego neste momento", pôs a nu toda a dimensão de cegueira neoliberal, de incompetência e de disparate que marca o rumo e as práticas da sua governação. Mas é dramático que isto seja assumido como uma estratégia, confirmada, aliás, pelas afirmações de António Borges dois dias depois.
A brutal e injusta austeridade faz sofrer as pessoas, mas parece que também cega e estupidifica quem as impõe.
A afirmação do primeiro-ministro (PM) situa-se para além dos limites do bom senso e da decência política. É caso para lhe dizer: abre os olhos, obcecado! Não vês a queda da procura? Não vês a situação das empresas? Não vês a vida concreta das pessoas?
O problema de fundo é que estamos perante alguém que não cumpre os requisitos mínimos para se manter nas funções efetivas de primeiro-ministro de Portugal. Passos Coelho chegou a PM através de um ato eleitoral, isso é um facto, mas ele não governa de acordo com os compromissos que assumiu e não é um intérprete fiável dos interesses dos portugueses. Comporta-se simplesmente como executor das medidas que vão traçando os tecnocratas indigitados pelos nossos credores e agiotas (incluindo os Borges), com vista a explorar, até ao limite, o povo português.
Infelizmente, pelo menos três gerações de portugueses - aquelas que hoje sofrem com este desastroso rumo - vão dolorosamente lembrar-se por muito tempo deste roubo organizado, com dimensões externas e internas, feito ao seu país. E vão recordar-se das traições que estes governantes de ocasião e da mentira cometeram.
O que se está a passar nestes tempos em Portugal é uma proliferação de atos de insensibilidade social e humana, de malvadez mesquinha, de atentados à liberdade das pessoas e à soberania do povo.
Múltiplas personalidades com conhecimentos económicos, sociais e políticos, vários economistas, sindicalistas e até dirigentes empresariais já vieram explicar que, na situação que o país vive, mais do que em qualquer outra, o aumento do salário mínimo nacional (SMN) é um sinal social e económico necessário e gerador de emprego a prazo curto. Claro que se trata de uma opção contra o empobrecimento e a favor do Estado social.
O SMN (485 euros ilíquidos) está hoje abaixo do limiar da pobreza, é o mais baixo da Zona Euro, atinge diretamente mais de 11,3% dos trabalhadores ativos, mas há centenas de milhares de trabalhadores que ganham apenas uns euros acima e, como sabemos, o sinal dado pelo aumento do SMN tem repercussões naturais em toda a política salarial.
Face às carências de quem ganha o SMN ou pouco mais, todos os cêntimos que este puder melhorar desaguam de imediato no consumo, na dinamização das atividades económicas.
É imprescindível que não se deixe cair esta exigência de aumento imediato do SMN. Saúdo todos os esforços dos partidos políticos à esquerda e de movimentos sociais nesse sentido e saúdo a persistência da CGTP-IN que forçou o agendamento do seu debate na concertação social para o próximo dia 19. Entretanto, não posso deixar de fazer um comentário crítico à atitude da CIP. É positivo que não embarque na loucura do Governo de reduzir, reduzir os salários e que, embora de forma ténue, vá olhando para alguns problemas reais da economia e da maioria das empresas. Mas é inadmissível e maldoso o seu ato de aproveitar o drama do desemprego para tentar precarizar ainda mais as relações de trabalho.
Os dirigentes da CIP, como a generalidade dos empresários com uma formação mínima, sabem que reduzir os salários e precarizar o trabalho bloqueia o desenvolvimento e desencoraja o trabalho. Muitas vezes basta um indivíduo fazer contas para rapidamente concluir que a remuneração que lhe é atribuída não cobre os custos necessários para ir trabalhar.
Haja bom senso, verdadeiro e sério patriotismo.
A insanidade dos governantes resolve-se demitindo-os. E o povo está a dar sinais claros de que não se demite da responsabilidade de o exigir.

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